Primeira mulher
diretora de televisão, Lucille Ball criou em 1950 a Desilu
Productions, em parceria com o então marido Desi Arnaz. Ao
fundarem a própria empresa, o casal tinha a única intenção de produzir seu
projeto, pois ele havia sido recusado por todos os estúdios de cinema e TV.
Tratava-se de uma inovação, um teatro filmado que teria um episódio diferente a
cada semana. Lucille e Desi seriam os atores
principais, e não era só. Ele também seria o diretor e ela, vice-diretora. O
nome do projeto? “I Love Lucy”.
Como eu acredito que
todo mundo aqui já saiba, o seriado pioneiro lançado em 1951 virou
febre nacional e, anos depois, mundial. Lucille se consagrou
como maior comediante feminina de todos os tempos e Desi ganhou
respeito não só como músico e ator, mas também como diretor. Nada bobos, os
dois partiram para a expansão de seus negócios – em todos os sentidos.
Compraram um estúdio maior e sofisticaram a produção de “I Love
Lucy”.
Em 1960,
porém, a dupla de artistas se divorciou. Desi jogou a toalha
como diretor da Desilu Productions. Para não deixar a peteca cair,
Tia Lucy comprou a parte dele na Desilu e assumiu ela mesma o
posto. Vale lembrar que quando fundaram a empresa, Lucille Ball e Desi
Arnaz não entendiam absolutamente nada de negócios. Aprenderam tudo na
raça, administrando a própria empresa. Resultado: viraram empresários de
sucesso. Principalmente Tia Lucy que, ao se ver sozinha, mostrou ainda mais o
seu valor e abriu caminho para a mulherada num ambiente machista como a direção
de televisão. Anos depois, ela confessaria: “Tudo que sei, aprendi com Desi”.
Um gesto de humildade surpreendente da parte da mulher mais talentosa da
História da mídia mundial.
Em 1964, Lucille
Ball era não apenas umsucesso como humorista e estrela de sua própria
série, mas também como diretora e produtora televisiva. Seu estúdio, aliás, era
o único que realmente dava lucro. Buscando dar uma diversificada nas
produções, Lucille pediu que o seu então braço direito Herbert
Solow saísse à cata de ideias bacanas e originais. Ele voltou com dois
projetos: um era “Missão Impossível”, e o outro uma série
futurista criada por Gene Rodenberry, chamada “Star
Trek”.
Quando leu a sinopse
de “Star Trek”, Tia Lucy ficou praticamente obcecada. Certa
de que a série com temática espacial iria estourar, ela levou o projeto à
diretoria da CBS, um dos canais de televisão onde as produções
da Desilu eram exibidas. Os diretores da emissora se recusaram
a tirar “Star Trek” do papel, pois, segundo eles,
ficaria muito caro produzir a série. Lucille não desanimou:
bateu na porta da NBC, que cogitou botar o projeto em
prática. Só cogitou. Primeiro porque ficção científica era
algo que a NBC não possuía em sua grade de programação;
segundo, porque os diretores da emissora consideraram a série muito “cabeça”; e
terceiro, porque (adivinhem!) o orçamento era alto demais.
Nem assim Lucille
Ball se deixou abalar: propôs arcar com boa parte dos custos de
produção. Porém, o episódio-piloto, “The Cage”, lançado no
início de 1965, foi mal recebido pelo público. Tia Lucy acreditava
tanto em “Star Trek” que conseguiu dobrar os diretores
da NBC e fez com que a emissora encomendasse um segundo
episódio, que também teria parte da produção bancada pela Desilu.
Resultado: a humorista saiu ainda mais vitoriosa, porque o segundo episódio –
aquele que apresenta William Shatner como o Capitão
Kirk – teve bem mais audiência e a série-fenômeno passou a fazer parte
da programação da NBC, que a produziu em parceria com a Desilu de 1966 até 1967,
ano em que Lucille vendeu sua produtora à Paramount
Pictures. Sem a Desilu e sem Tia Lucy, “Star
Trek” continuou no ar sob nova direção – literalmente. A saga
original teve 79 episódios ao todo, e depois saiu do ar.
Nos anos seguintes,
vieram remakes, filmes, novas versões e novas gerações. Livros, revistas,
bonecos, camisetas. Sem falar nos DVDs e Blu-Rays. “Star Trek” se tornou uma franquia
poderosa, uma das mais lucrativas da História de Hollywood segundo
a revista norte-americana Forbes (https://www.forbes.com/sites/quora/2016/07/28/theres-a-reason-why-star-trek-remains-so-popular/?sh=f6a60ad1dc39).
Em 50 anos, mais de 700 episódios e 13 filmes da saga foram feitos. É possível
assistir a horas e horas de ‘produtos’ da franquia “Star Trek” sem
ver nada repetido!
A visão otimista de
futuro que a série transmite se baseia na crença que Gene Roddenberry possuía
no ser humano perfeito e num futuro onde tudo daria certo. Isso explica o
sucesso da trama entre os adolescentes e os jovens adultos. A razão da
continuidade e impecável da franquia “Star Trek” é a
competência dos produtores em escalar um elenco perfeito e contratar
roteiristas craques em seu ofício – dessa forma, a coerência da série foi
mantida. E a visão de diversidade – vários personagens diferentes trabalhando
juntos – trouxe fãs de todas as cores, raças e gêneros. A diva Whoopi
Goldberg, por exemplo, confessou ser fã da série porque a personagem da
atriz Nichelle Nichols (que era afrodescendente) a fazia
acreditar que mulheres negras seriam parte do futuro. Aliás, quando Nichelle pensou
em abandonar a série, ninguém menos que Martin Luther King a
convenceu a não fazer isso. “Sua personagem é um símbolo de esperança na
igualdade”, teria dito o ativista político e líder da luta contra o racismo.
Muitos fãs se referem
a Lucille Ball como a “madrinha” ou até “mãe” de “Star
Trek”. Muitos deles também têm grande admiração pelo trabalho dela como
comediante. Não dá pra negar que Tia Lucy tinha visão de futuro – em todos os
sentidos. Prova disso é que ela nunca se interessou muito por ficção
científica, mas acreditou no projeto porque soube captar o espírito dele, coisa
que os diretores das emissoras tinham dificuldade de fazer. Além de parte
indispensável da mitologia hollywoodiana, “Star Trek” é
uma página a mais na história de uma mulher que audaciosamente foi onde nenhuma
mulher jamais esteve.
Para
alegrar um pouco seu dia, a dancinha de Marilyn Monroe em “Os
Homens Preferem As Loiras”, filme de 1953 que inspirou
o clipe da música “Material Girl”, hit maior de Madonna em 1984 (https://www.youtube.com/watch?v=6p-lDYPR2P8).
Ontem,
fuçando no Google em busca de
inspiração para o texto da semana, eu me deparei com isso. Minha reação inicial
foi de espanto, mas acabei dando boas risadas. A notícia é velha, mas me
impressionou tanto que eu decidi compartilhar.
Em 2018, uma artesã conhecida como Trixxbrixx(foto acima) recriou, utilizando peças de Lego, o que seria um estúdio de cinema da antiga Hollywood. Batizado de Hollywood
Brictures, um trocadilho com os termos “brick” (tijolo em inglês) e “pictures”
(filmes), o projeto reproduz com incrível fidelidade o que teria sido uma MGM, uma Warner, uma Columbia ou
qualquer outra fábrica de sonhos da Meca do Cinema seis, sete ou até oito
décadas atrás. O estúdio fictício possui sets de filmagem, sala de edição e
montagem dos filmes, departamento de arte, escritório do diretor e até um
depósito de objetos de cena. É de impressionar até onde a imaginação de uma
cinéfila apaixonada (dessa vez estou falando dela, e não de mim) pode chegar:
Vista aérea do estúdio:
Parece um antigo casarão da Califórnia convertido em imóvel
comercial e adaptado para a produção de filmes. Diversos estúdios de Hollywood, na época em que o cinema
ainda era uma arte nova e recente, começaram assim. Um belo exemplo foi o Charles Chaplin Studio
(https://en.wikipedia.org/wiki/Jim_Henson_Company_Lot), que hoje abriga a Jim Henson Company, fundada por Jim Henson, o criador dos Muppets (LINK).
Pátio:
Quem já viu fotos antigas de
estúdios de cinema com certeza já reparou que a maioria deles possuía jardim
com fonte, canteiros de flores e algumas árvores fazendo sombra para amenizar o
sol californiano. Tudo numa arquitetura típica do sul dos Estados Unidos, que possui forte influência espanhola.
Departamento de Arte (Sala
1):
Walt
Disney e Walter Lantz
(https://poltrona-r.blogspot.com/2016/10/walt-disney-versus-walter-lantz-tinha.html) com certeza trabalhavam numa sala bem parecida com essa. Em cima da mesa
vê-se o que parece ser uma sequência desenhada para algum filme de animação.
Pincel, latas de tinta e um esboço de créditos de abertura de alguma
superprodução nos dão a ideia de como se trabalhava antes da computação gráfica
tomar conta da indústria do entretenimento: tudo feito à mão, do começo ao fim.
É, dava trabalho, mesmo.
Depósito de Objetos de Cena:
É o “cômodo” mais curioso do
estúdio. Nele se vê bananas de dinamite (cenográficas, é claro), uma cabeça de
robô, armas de mentirinha, peruca estilo Elvis
Presley e um peixe falso. Diretores, produtores e atores de “trash movies”
deviam frequentar muito essa sala.
Escritório do Chefe do
Estúdio:
Escrivaninha suntuosa com
uma cadeira que mais parece um trono, prateleira cheia de Oscars e outros prêmios da indústria do cinema, uma estrela da
calçada da fama pendurada na parede, e uma mesa de canto com bule de café,
garrafa de whisky e balde de gelo. Sobre a escrivaninha há uma luminária, um
envelope grande, daqueles de carta, e um livro que o chefão do estúdio
provavelmente está lendo para ver se vale a pena comprar os direitos e
transformar numa superprodução. Não é nada difícil imaginar um Jack Warner, um Louis B. Mayer ou um Harry
Cohn sentado neste escritório, dando murros na escrivaninha e esbravejando
contra algum subordinado. Dá até medo.
Departamento de Edição:
Tesoura, rolos de filme,
moviolas e pedaços de fita de celuloide – tudo isso nos dá mais um motivo para admirar
– ou, pelo menos, respeitar – os pioneiros do cinema. O trabalho dos caras era
artesanal do começo ao fim. Nesta sala onde os filmes eram editados, vemos uma
mesa de montagem, uma lata de lixo no chão para jogar os trechos filmados não
aproveitáveis e até um relógio de parede marcando quinze para meio-dia. Pelo
visto, estava quase na hora do almoço dos editores!
Departamento de Arte (Sala
2):
Tudo indica que esta segunda
ala do departamento de arte era mais dedicada à cenografia. Há uma prancheta de
desenhista, com pincel e latas de tinta sobre um gaveteiro, e o supra-sumo da
viajada: uma maquete de casa sobre uma prateleira. Há também um quadro
(provavelmente mera decoração) e um mapa-múndi na parede. Luminárias de mesa e
no teto tornavam o ambiente mais claro e melhor para os artistas dos bastidores
criarem.
Sets de Filmagem:
Tudo leva a crer que a Hollywood Brictures está produzindo um
faroeste: veja os cenários das gravações. Tem um saloon e até uma cadeia! Algo
curioso é que no canto direito existe uma tela pintada com um céu azul com duas
nuvens e o sol, com certeza para servir de cenário, naqueles tempos remotos em
que nem mesmo o Chroma Key
(https://pt.wikipedia.org/wiki/Chroma_key) havia sido inventado.
Filmes
de Brinquedo
Logicamente,
vendo esse tipo de coisa, qualquer pessoa fanática por cinema e/ou por História
já começa a imaginar e inventar histórias. A autora do Hollywood Bricktures não incluiu personagens na sua impressionante
obra, mas em 2014, o jovem
legomaníaco Morgan Spence nos deu um
gostinho de como seriam certos atores clássicos em versão Lego ao recriar cenas de alguns dos filmes famosos deles usando o
famoso brinquedo. Detalhe: o rapaz tinha apenas 15 anos quando elaborou as
pérolas que você verá agora.
Luzes da Cidade (1931)
Aconteceu Naquela Noite
(1934)
O Mágico de Oz (1939)
E O Vento Levou (1939)
Casablanca (1942)
Cantando Na Chuva (1952)
Psicose (1969)
Bonequinha de Luxo (1961)
O Poderoso Chefão (1972)
O Iluminado (1980)
Protesto
Irreverente
Como
se não bastasse, já fizeram até uma réplica do Oscar em Lego.
Inconformado por ter sido deixado de fora da maior premiação da indústria do
cinema, Phil Lord, o diretor de “Uma
Aventura Lego” (filme de 2014)
protestou construindo sua própria estatueta utilizando o famoso jogo de montar.
Ele
fez escola. No ano seguinte, o lego-artista Nathan Sewaya confeccionou várias réplicas desse Oscar alternativo para distribuir para
as celebridades durante a cerimônia de entrega do prêmio. Cada estatueta foi
feita com 500 peças de Lego. E não é
que o Oscar de brinquedo passou a ser mais disputado que o verdadeiro? Julianne Moore e Emma Stone que o digam!
Se
você mora neste planeta há algum tempo, com certeza já assistiu a algum desenho
dos Looney Tunes. Caso o nome não signifique nada para você, são os
desenhos da Warner Bros., que tinham como personagens figuras clássicas
como Pernalonga, Patolino, Ligeirinho, Frajola e Papa-Léguas.
A série de animações foi produzida entre 1930 e 1969, um período
fértil em termos de criatividade para esse tipo de arte.
O
que eu sempre quis saber é: qual a origem dos Looney Tunes? O que
significa esse nome, e o que quer dizer “Merry Melodies”, que a
gente via escrito em muitas vinhetas de abertura desses desenhos? Quem bolou a
icônica trilha sonora? A empresa ACME realmente existiu? E como surgiu o
bordão “Por hoje é só, pessoal!” (“That’s all, folks”,
em inglês)? Resolvi finalmente matar a curiosidade e dividir minhas descobertas
com vocês.
Nossa
história começa (aposto que você leu com a voz do narrador do Looney Tunes!)
no ano de 1930, quando um cara chamado Walt Disney (que dispensa
apresentações) estava bombando nos cinemas com a histórica série de desenhos
chamada “Silly Symphonies” (em português, “Sinfonias Tolas”),
que trouxe personagens como os Três Porquinhos. De olho na concorrência,
os irmãos Warner, donos do estúdio de mesmo nome, escalaram o produtor Leon
Schlesinger para criar a própria linha de animações da casa. O nome do
projeto era descaradamente parecido: “Looney Tunes” (uma
brincadeira com a expressão “Canções Malucas”). Como se não
bastasse, a Warner Bros. criou no ano seguinte (1931) uma
série-irmã dos Looney Tunes, chamada (vejam só) “Merrie Melodies”
(que significa “Melodias Alegres”).
Se
no nome as produções da Warner não eram nada criativas, em todo o resto
elas foram revolucionárias. Os primeiros personagens foram a hoje pouco
lembrada dupla Bosko & Honey, um sub-Mickey e uma sub-Minnie.
Nos créditos já se via os nomes de Paul Smith (que mais tarde
trabalharia com Walter Lantz, o criador do Pica-Pau) e Isadore
“Friz” Freleng (que continuaria por muito tempo no estúdio até deixá-lo em 1963,
para fazer “A Turma Da Pantera Cor de Rosa”). Eram desenhos
boboquinhas, cujo traço copiava descaradamente o das primeiras animações do Mickey,
como o pioneiro “Steamboat Willie” (https://www.youtube.com/watch?v=hxf-UHuGobI).
Neste episódio de Bosko que eu compartilho abaixo, dá pra ver a polêmica
que a série iria causar, pois o personagem não é um animal, e sim (o que parece
ser) um garoto negro. Tá legal, não é nenhum Mickey Mouse, mas tem cenas
hilárias como a da vaquinha dançarina que, não sei por que motivo, me fez
lembrar a Vaca Gilda, personagem do cartunista e apresentador infantil
brasileiro Daniel Azulay na década de 1980 (https://www.youtube.com/watch?v=UXZyKFRj90o).
A
Warner apostou com tudo no personagem. Acredite, em apenas três anos
foram feitos 57 curtas de Bosko e sua turma. Inclusive, no episódio “Sinkin’
In The Bathtub” (“Afundando na Banheira”) foi usada pela
primeira vez a frase “That’s All, Folks” (“Por hoje é só, pessoal!”),
que viraria o tradicional bordão de encerramento dos Looney Tunes. https://www.youtube.com/watch?v=GaE6OySzq5g&list=PLYQzAkyHuhtSAw5EsYqreAKB8b7xeStS6&index=5
Após
desentendimentos, os animadores Hugh Harman e Rudolf Ising se
desentenderam com Schlesinger e foram trabalhar para a MGM. Há
males que vêm para bem. Friz Freleng, o diretor que permaneceu na
Warner, reuniu um time de jovens animadores para recomeçar a série praticamente
do zero. Neste seleto grupo, estavam Bob Clampett e Charles “Chuck”
Jones, que se tornariam pilares da série nos anos seguintes. Deu resultado.
Em 1935, estreava nas telas o primeiro personagem clássico dos Looney
Tunes, o Gaguinho (Porky Pig, em inglês).
O
suíno tímido de fala atrapalhada ganhou o coração do público, inaugurando uma
galeria de tipos icônicos. O briguento Patolino (Daffy Duck, no
original) foi lançado para concorrer com o também pato e também nervosinho Donald
da Disney, mas acabou ganhando personalidade e luz próprias.
Feliz
com o sucesso dos novos personagens, a WarnerBros. decidiu criar
um companheiro de trapalhadas para o Gaguinho. Tex Avery, Chuck
Jones e Bob Clampett se juntaram para construir essa figura.
Misturaram Groucho Marx com Clark Gable e o mundo animal, e o que
saiu foi um coelho completamente alucinado, irreverente e debochado, que adora
comer cenoura. Era ele mesmo, o Pernalonga. Seu nome em inglês, Bugs
Bunny, significa algo como “coelho doido”, e definia bem o que era o
personagem. Inclusive, o hábito do Pernalonga de devorar cenouras surgiu
de uma cena do filme “Aconteceu Naquela Noite” (https://poltrona-r.blogspot.com/2016/10/dvd-aconteceu-naquela-noite.html),
em que o personagem de Gable come este legume em um lanche rápido (https://www.youtube.com/watch?v=Wcrth90C3D4).
Toda vez que era provocado, Pernalonga encarava o adversário com cinismo e soltava
o inconfundível bordão “O que é que há, velhinho?” (“What’s up, doc?”,
no original).
Mas
quem iria dar uma voz ao Pernalonga? Ninguém menos do que o genial Mel Blanc
(https://poltrona-r.blogspot.com/2017/04/mel-blanc-o-homem-das-mil-vozes.html),
o maior dublador da história dos desenhos animados. Uma curiosidade bizarra é
que a risada criada por Blanc para o desenho “Porky’s Hare Hunt”
(“Gaguinho na caça ao coelho”) não emplacou nos desenhos da Warner, mas viraria febre ao ser aproveitada
em outro ícone da animação, o Pica-Pau, de Walter Lantz. Assistindo
ao episódio hoje, é bastante estranho ouvir a gargalhada do pássaro doidão na
boca de outro personagem. Vale a pena conferir:
Enquanto
a “Silly Symphonies” da Disney já tinha desenhos em Technicolor
desde praticamente seu início, os “Looney Tunes” da Warner ainda
eram produzidos em branco e preto. “Merrie Melodies”, porém, já
era colorida. A partir de 1943, ambas as séries passaram a ser
produzidas em cores.
Em
obras de animação, a música é tudo. E os desenhos da Warner Bros. já
haviam utilizado toda a vasta biblioteca musical do estúdio em 1937,
quando o grudento tema de abertura e encerramento dos Looney Tunes,
intitulado “The Merry-Go-Round Broke Down”, composto por Cliff
Friend e Dave Franklin, começou a ser utilizado (https://www.youtube.com/watch?v=XwiQVKOrejo).
No mesmo ano, “Merrily We Roll Along”, de autoria de Charles
Tobias, Murray Mencher e Eddie Cantor, foi escolhida como
trilha de “Merrie Melodies” (https://www.youtube.com/watch?v=mGM0xkHD6jQ).
Agora,
com Pernalonga, Patolino e Gaguinho, a Warner Bros.
finalmente tinha munição para peitar a Disney. Mas faltava um diferencial. A Warner
teve uma sacada: ao contrário do estúdio do mestre Walt, que produzia
desenhos ingênuos, voltados mais às crianças e trazendo lições de moral, os Looney
Tunes iriam esculachar. Pernalonga e sua turma viveriam aventuras
recheadas de sarcasmo, irreverência e crítica social. E não foi só isso. Em vez
de seguir o estilo disneyano de dar aos personagens e cenários o maior
realismo possível, a estética escolhida pela Warner foi deixar os
desenhos com aparência propositalmente tosca, mas recorrer ao deboche e a
sacadas surrealistas, como objetos inanimados que, do nada, ganhavam vida
própria.
Outra
coisa interessante de se observar é que os desenhos da Warner Bros. que
tinham bichos como protagonistas misturavam personagens humanos e animais,
coisa que não ocorria nos curtas da Disney estrelados por Mickey,
Pateta e Donald. Já os Looney Tunes geralmente se valiam
dessa combinação para ridicularizar gente, e não bichos. Isso incluía
celebridades, como Humphrey Bogart, o astro do filme “Casablanca”.
Ele dá uma “canja” neste episódio que eu separei, feito em 1950. O
título é “8 Ball Bunny”, batizado no Brasil de “Esse
Pinguim É Uma Fria”.
Uma
coisa importante de lembrar é que nos anos 30 e 40, ainda não existia um
público-alvo específico para os desenhos animados. Os curtas de animação eram
exibidos antes dos filmes, como uma espécie de “aperitivo”. Dá para entender
por que vários cartunistas da época inseriam piadas adultas em suas obras. Aos
poucos a Disney foi investindo cada vez mais no chamado entretenimento
familiar (agradar principalmente às crianças, mas também às outras faixas
etárias). A Warner Bros., porém, manteve o humor como carro-chefe. E
revolucionou ao “quebrar a quarta parede” (ou seja, fez com que os personagens conversassem
com o público) em alguns episódios.
O
elenco animado da Warner foi aumentando nos anos seguintes: vieram Piu-Piu
(Tweety) em 1942, Frajola (Sylvester) em 1945,
Frangolino (Foghorn Leghorn) em 1946, Papa Léguas (Road
Runner) em 1949, Taz (Tasmanian Devil) em 1954, Ligeirinho (Speedy Gonzales) em 1955,
e vários outros que eu só não vou citar aqui por falta de espaço. Um personagem
polêmico, o gambá conquistador Pepe Le Pew (que, até hoje, muitos
consideram um estereótipo racial dos franceses), havia sido idealizado por Chuck
Jones em 1930, mas só foi resgatado e aproveitado em 1945. A
inspiração para Pepe foi o ator Charles Boyer.
A
popularidade dos Looney Tunes já era grande, mas explodiu durante a década
de 1950, quando a série foi exibida, junto com “Merrie Melodies”,
na televisão, que era uma mídia recém-criada. Porém, os desenhos foram, em sua
maioria, editados e tiveram cenas cortadas por serem tidas como inadequadas ao
público infantil. Nos anos 60, a Warner Bros. desativou seu
estúdio de animação, e os desenhos de curta-metragem passaram a ser produzidos
pela De-Patie Freleng, estúdio que tinha como sócios David DePatie
e Friz Freleng. A queda na qualidade dos trabalhos era visível logo nos
créditos, que já davam uma ideia do empobrecimento visual que essa mudança
tinha provocado.
Entre
as décadas de 1970 e 1990, foram produzidos diversos especiais e
longa-metragens com Pernalonga e Patolino, mesclando trechos de
desenhos antigos a cenas inéditas. Era uma nova geração de fãs que estava
surgindo. Porém, a produção de curta-metragens foi retomada apenas em 1987.
Além disso, a TV a cabo passou a exibir a chamada “Hora ACME”,
dedicada exclusivamente a desenhos clássicos da Warner Bros.
Mas
que diabos é ACME? Espécie de versão ianque das Organizações Tabajara
do “Casseta e Planeta” (https://www.youtube.com/watch?v=CJyZT5YkQa0),
a ACME era um conglomerado fictício que fabricava os produtos
inimagináveis que os personagens da Warner utilizavam nos desenhos. A
primeira vez que a marca apareceu foi no curta-metragem “Buddy’s Bug
Hunt”, de 1935 (https://www.youtube.com/watch?v=oYcpuZMcl_Y&t=15s).
O nome ACME é uma sigla que significa “A Company That Makes
Everything” (“uma empresa que faz tudo”). O maior cliente da ACME
era, com certeza, Coyote, o vilão que recorria aos lançamentos da
empresa para tentar capturar o Papa-Léguas. Garimpando no YouTube,
encontrei essa montagem só com produtos ACME, em cenas extraídas de
episódios variados. Tem livro, graxa, cola, ração pra passarinho, ratoeira, brinquedos,
roupas, remédio pra dor de cabeça, papel pega-mosca... Enfim, a ACME
produzia de tudo, mesmo.
Falando
em produtos, na vida real a franquia Looney Tunes virou uma marca cuja
força faria inveja aos “donos” da ACME, caso a superempresa que Coyote
adora realmente existisse. Todo tipo de artigos com a imagem dos personagens já
foi lançado no mercado.
Inclusive,
os Looney Tunes alcançaram uma glória sonhada por muita celebridade hollywoodiana
nos anos 70 e 80: virar cabeça das balas PEZ. De origem
austríaca, as guloseimas tinham como marca registrada a embalagem retangular cuja
parte de cima era o rosto de algum personagem da moda. Na minha época, a gente
ganhava essas balas como lembrancinha nas festas de aniversário das outras
crianças e guardava como se fosse souvenir. Como o colecionismo estava no auge,
havia meninas e meninos que tinham um arsenal de embalagens de PEZ e até
trocava aquelas com personagens repetidos, como se fossem figurinhas.
Como
era de se esperar, essa foi mais uma idéia nada original, mas totalmente
certeira. Os Baby Looney Tunes ganharam o coração da garotada mais
novinha e, claro, geraram lucros e deram origem a uma linha própria de
produtos, a maioria destinados a bebês. Para quem quer divertir a molecadinha,
essa página aqui tem ilustrações dos Baby Looney Tunes para imprimir e
colorir: http://www.desenhosparacolorir.org/desenhos/104-desenhos-para-colorir-Baby-Looney-Tunes.html
Acredito
que mais gerações de fãs dos Looney Tunes ainda virão. Principalmente se
o acesso aos episódios mais antigos for facilitado. São obras que fizeram
história, tanto no cinema quanto na vida da gente. A saga dos Looney Tunes na indústria do entretenimento ainda está longe de acabar. Mas aqui no blog, por hoje é só, pessoal!