terça-feira, 24 de novembro de 2020

VOCÊ AMA STAR TREK? AGRADEÇA A LUCILLE BALL!





    Sou uma fã gigantesca de Lucille Ball desde criança, e tenho um grande respeito por “Star Trek” e a importância da franquia para a cultura pop. Inclusive, já escancarei minha adoração por Tia Lucy neste blog (https://poltrona-r.blogspot.com/2016/08/meus-15-momentos-preferidos-de-lucille.html), embora não tenha passado o pano para os defeitos dela (https://poltrona-r.blogspot.com/2017/09/mexe-com-quem-ta-quieto-as-nao-poucas.html). Por isso, ao ler sobre ela para fazer um texto (outro texto, que nada tem a ver com esta matéria), uma passagem da vida dessa mulher essencial não apenas para o humor, mas para a história do cinema, me chamou a atenção.

    Primeira mulher diretora de televisão, Lucille Ball criou em 1950 a Desilu Productions, em parceria com o então marido Desi Arnaz. Ao fundarem a própria empresa, o casal tinha a única intenção de produzir seu projeto, pois ele havia sido recusado por todos os estúdios de cinema e TV. Tratava-se de uma inovação, um teatro filmado que teria um episódio diferente a cada semana. Lucille e Desi seriam os atores principais, e não era só. Ele também seria o diretor e ela, vice-diretora. O nome do projeto? “I Love Lucy”.

 


    Como eu acredito que todo mundo aqui já saiba, o seriado pioneiro lançado em 1951 virou febre nacional e, anos depois, mundial. Lucille se consagrou como maior comediante feminina de todos os tempos e Desi ganhou respeito não só como músico e ator, mas também como diretor. Nada bobos, os dois partiram para a expansão de seus negócios – em todos os sentidos. Compraram um estúdio maior e sofisticaram a produção de “I Love Lucy”.

    Em 1960, porém, a dupla de artistas se divorciou. Desi jogou a toalha como diretor da Desilu Productions. Para não deixar a peteca cair, Tia Lucy comprou a parte dele na Desilu e assumiu ela mesma o posto. Vale lembrar que quando fundaram a empresa, Lucille Ball e Desi Arnaz não entendiam absolutamente nada de negócios. Aprenderam tudo na raça, administrando a própria empresa. Resultado: viraram empresários de sucesso. Principalmente Tia Lucy que, ao se ver sozinha, mostrou ainda mais o seu valor e abriu caminho para a mulherada num ambiente machista como a direção de televisão. Anos depois, ela confessaria: “Tudo que sei, aprendi com Desi”. Um gesto de humildade surpreendente da parte da mulher mais talentosa da História da mídia mundial.

  


    Em 1964Lucille Ball era não apenas umsucesso como humorista e estrela de sua própria série, mas também como diretora e produtora televisiva. Seu estúdio, aliás, era o único que realmente dava lucro. Buscando dar uma diversificada nas produções, Lucille pediu que o seu então braço direito Herbert Solow saísse à cata de ideias bacanas e originais. Ele voltou com dois projetos: um era “Missão Impossível”, e o outro uma série futurista criada por Gene Rodenberry, chamada “Star Trek”.

    Quando leu a sinopse de “Star Trek”, Tia Lucy ficou praticamente obcecada. Certa de que a série com temática espacial iria estourar, ela levou o projeto à diretoria da CBS, um dos canais de televisão onde as produções da Desilu eram exibidas. Os diretores da emissora se recusaram a tirar “Star Trek” do papel, pois, segundo eles, ficaria muito caro produzir a série. Lucille não desanimou: bateu na porta da NBC, que cogitou botar o projeto em prática.  cogitou. Primeiro porque ficção científica era algo que a NBC não possuía em sua grade de programação; segundo, porque os diretores da emissora consideraram a série muito “cabeça”; e terceiro, porque (adivinhem!) o orçamento era alto demais.

 




    Nem assim Lucille Ball se deixou abalar: propôs arcar com boa parte dos custos de produção. Porém, o episódio-piloto, “The Cage”, lançado no início de 1965, foi mal recebido pelo público. Tia Lucy acreditava tanto em “Star Trek” que conseguiu dobrar os diretores da NBC e fez com que a emissora encomendasse um segundo episódio, que também teria parte da produção bancada pela Desilu. Resultado: a humorista saiu ainda mais vitoriosa, porque o segundo episódio – aquele que apresenta William Shatner como o Capitão Kirk – teve bem mais audiência e a série-fenômeno passou a fazer parte da programação da NBC, que a produziu em parceria com a Desilu de 1966 até 1967, ano em que Lucille vendeu sua produtora à Paramount Pictures. Sem a Desilu e sem Tia Lucy, “Star Trek” continuou no ar sob nova direção – literalmente. A saga original teve 79 episódios ao todo, e depois saiu do ar.

    Nos anos seguintes, vieram remakes, filmes, novas versões e novas gerações. Livros, revistas, bonecos, camisetas. Sem falar nos DVDs e Blu-Rays. “Star Trek” se tornou uma franquia poderosa, uma das mais lucrativas da História de Hollywood segundo a revista norte-americana Forbes (https://www.forbes.com/sites/quora/2016/07/28/theres-a-reason-why-star-trek-remains-so-popular/?sh=f6a60ad1dc39). Em 50 anos, mais de 700 episódios e 13 filmes da saga foram feitos. É possível assistir a horas e horas de ‘produtos’ da franquia “Star Trek” sem ver nada repetido!

 



    A visão otimista de futuro que a série transmite se baseia na crença que Gene Roddenberry possuía no ser humano perfeito e num futuro onde tudo daria certo. Isso explica o sucesso da trama entre os adolescentes e os jovens adultos. A razão da continuidade e impecável da franquia “Star Trek” é a competência dos produtores em escalar um elenco perfeito e contratar roteiristas craques em seu ofício – dessa forma, a coerência da série foi mantida. E a visão de diversidade – vários personagens diferentes trabalhando juntos – trouxe fãs de todas as cores, raças e gêneros. A diva Whoopi Goldberg, por exemplo, confessou ser fã da série porque a personagem da atriz Nichelle Nichols (que era afrodescendente) a fazia acreditar que mulheres negras seriam parte do futuro. Aliás, quando Nichelle pensou em abandonar a série, ninguém menos que Martin Luther King a convenceu a não fazer isso. “Sua personagem é um símbolo de esperança na igualdade”, teria dito o ativista político e líder da luta contra o racismo.

   Muitos fãs se referem a Lucille Ball como a “madrinha” ou até “mãe” de “Star Trek”. Muitos deles também têm grande admiração pelo trabalho dela como comediante. Não dá pra negar que Tia Lucy tinha visão de futuro – em todos os sentidos. Prova disso é que ela nunca se interessou muito por ficção científica, mas acreditou no projeto porque soube captar o espírito dele, coisa que os diretores das emissoras tinham dificuldade de fazer. Além de parte indispensável da mitologia hollywoodiana, “Star Trek” é uma página a mais na história de uma mulher que audaciosamente foi onde nenhuma mulher jamais esteve. 




 

FONTES

https://www.huffpostbrasil.com/entry/lucille-ball-star-trek-surprising-celebrity-producers_n_3756120?ri18n=true

http://www.thoughtsfromatvgeek.com/2013/09/star-trek-fans-owe-it-all-to-lucille.html

http://www.adorocinema.com/noticias/series/noticia-122814/

https://intl.startrek.com/news/how-lucille-ball-helped-star-trek-become-a-cultural-icon

https://www.terra.com.br/diversao/cinema/voce-sabia-que-lucille-ball-salvou-star-trek,c37536dea74e85cff4500859f742ce57u215u0mz.html

https://ew.com/article/2016/07/08/lucille-ball-star-trek/

https://memory-alpha.fandom.com/wiki/Lucille_Ball

https://www.businessinsider.com/lucille-ball-is-the-reason-we-have-star-trek-heres-what-happened-2016-7

https://www.wearethemighty.com/mighty-movies/star-trek/

https://www.cheatsheet.com/entertainment/lucille-ball-overruled-her-board-of-directors-to-get-star-trek-produced.html/

https://pt.wikipedia.org/wiki/Desilu_Productions

https://en.wikipedia.org/wiki/Lucille_Ball#I_Love_Lucy_and_Desi

 

 

 


segunda-feira, 23 de novembro de 2020

GIF DO DIA – 23/11/2020

Para alegrar um pouco seu dia, a dancinha de Marilyn Monroe em “Os Homens Preferem As Loiras”, filme de 1953 que inspirou o clipe da música “Material Girl”, hit maior de Madonna em 1984 (https://www.youtube.com/watch?v=6p-lDYPR2P8).



terça-feira, 17 de novembro de 2020

A HOLLYWOOD CLÁSSICA EM VERSÃO LEGO


Ontem, fuçando no Google em busca de inspiração para o texto da semana, eu me deparei com isso. Minha reação inicial foi de espanto, mas acabei dando boas risadas. A notícia é velha, mas me impressionou tanto que eu decidi compartilhar.

Em 2018, uma artesã conhecida como Trixxbrixx (foto acima) recriou, utilizando peças de Lego, o que seria um estúdio de cinema da antiga Hollywood. Batizado de Hollywood Brictures, um trocadilho com os termos “brick” (tijolo em inglês) e “pictures” (filmes), o projeto reproduz com incrível fidelidade o que teria sido uma MGM, uma Warner, uma Columbia ou qualquer outra fábrica de sonhos da Meca do Cinema seis, sete ou até oito décadas atrás. O estúdio fictício possui sets de filmagem, sala de edição e montagem dos filmes, departamento de arte, escritório do diretor e até um depósito de objetos de cena. É de impressionar até onde a imaginação de uma cinéfila apaixonada (dessa vez estou falando dela, e não de mim) pode chegar:


Vista aérea do estúdio:


Parece um antigo casarão da Califórnia convertido em imóvel comercial e adaptado para a produção de filmes. Diversos estúdios de Hollywood, na época em que o cinema ainda era uma arte nova e recente, começaram assim. Um belo exemplo foi o Charles Chaplin Studio (https://en.wikipedia.org/wiki/Jim_Henson_Company_Lot), que hoje abriga a Jim Henson Company, fundada por Jim Henson, o criador dos Muppets (LINK).



Pátio:


Quem já viu fotos antigas de estúdios de cinema com certeza já reparou que a maioria deles possuía jardim com fonte, canteiros de flores e algumas árvores fazendo sombra para amenizar o sol californiano. Tudo numa arquitetura típica do sul dos Estados Unidos, que possui forte influência espanhola.



Departamento de Arte (Sala 1):


Walt Disney e Walter Lantz (https://poltrona-r.blogspot.com/2016/10/walt-disney-versus-walter-lantz-tinha.html) com certeza trabalhavam numa sala bem parecida com essa. Em cima da mesa vê-se o que parece ser uma sequência desenhada para algum filme de animação. Pincel, latas de tinta e um esboço de créditos de abertura de alguma superprodução nos dão a ideia de como se trabalhava antes da computação gráfica tomar conta da indústria do entretenimento: tudo feito à mão, do começo ao fim. É, dava trabalho, mesmo.



Depósito de Objetos de Cena:


É o “cômodo” mais curioso do estúdio. Nele se vê bananas de dinamite (cenográficas, é claro), uma cabeça de robô, armas de mentirinha, peruca estilo Elvis Presley e um peixe falso. Diretores, produtores e atores de “trash movies” deviam frequentar muito essa sala.



Escritório do Chefe do Estúdio:


Escrivaninha suntuosa com uma cadeira que mais parece um trono, prateleira cheia de Oscars e outros prêmios da indústria do cinema, uma estrela da calçada da fama pendurada na parede, e uma mesa de canto com bule de café, garrafa de whisky e balde de gelo. Sobre a escrivaninha há uma luminária, um envelope grande, daqueles de carta, e um livro que o chefão do estúdio provavelmente está lendo para ver se vale a pena comprar os direitos e transformar numa superprodução. Não é nada difícil imaginar um Jack Warner, um Louis B. Mayer ou um Harry Cohn sentado neste escritório, dando murros na escrivaninha e esbravejando contra algum subordinado. Dá até medo.



Departamento de Edição:


Tesoura, rolos de filme, moviolas e pedaços de fita de celuloide – tudo isso nos dá mais um motivo para admirar – ou, pelo menos, respeitar – os pioneiros do cinema. O trabalho dos caras era artesanal do começo ao fim. Nesta sala onde os filmes eram editados, vemos uma mesa de montagem, uma lata de lixo no chão para jogar os trechos filmados não aproveitáveis e até um relógio de parede marcando quinze para meio-dia. Pelo visto, estava quase na hora do almoço dos editores!



Departamento de Arte (Sala 2):


Tudo indica que esta segunda ala do departamento de arte era mais dedicada à cenografia. Há uma prancheta de desenhista, com pincel e latas de tinta sobre um gaveteiro, e o supra-sumo da viajada: uma maquete de casa sobre uma prateleira. Há também um quadro (provavelmente mera decoração) e um mapa-múndi na parede. Luminárias de mesa e no teto tornavam o ambiente mais claro e melhor para os artistas dos bastidores criarem.



Sets de Filmagem:


Tudo leva a crer que a Hollywood Brictures está produzindo um faroeste: veja os cenários das gravações. Tem um saloon e até uma cadeia! Algo curioso é que no canto direito existe uma tela pintada com um céu azul com duas nuvens e o sol, com certeza para servir de cenário, naqueles tempos remotos em que nem mesmo o Chroma Key (https://pt.wikipedia.org/wiki/Chroma_key) havia sido inventado.

 


Filmes de Brinquedo


Logicamente, vendo esse tipo de coisa, qualquer pessoa fanática por cinema e/ou por História já começa a imaginar e inventar histórias. A autora do Hollywood Bricktures não incluiu personagens na sua impressionante obra, mas em 2014, o jovem legomaníaco Morgan Spence nos deu um gostinho de como seriam certos atores clássicos em versão Lego ao recriar cenas de alguns dos filmes famosos deles usando o famoso brinquedo. Detalhe: o rapaz tinha apenas 15 anos quando elaborou as pérolas que você verá agora.


Luzes da Cidade (1931)




Aconteceu Naquela Noite (1934)




O Mágico de Oz (1939)






E O Vento Levou (1939)




Casablanca (1942)





Cantando Na Chuva (1952)




Psicose (1969)




Bonequinha de Luxo (1961)





O Poderoso Chefão (1972)






O Iluminado (1980)






Protesto Irreverente


Como se não bastasse, já fizeram até uma réplica do Oscar em Lego. Inconformado por ter sido deixado de fora da maior premiação da indústria do cinema, Phil Lord, o diretor de “Uma Aventura Lego” (filme de 2014) protestou construindo sua própria estatueta utilizando o famoso jogo de montar.




Ele fez escola. No ano seguinte, o lego-artista Nathan Sewaya confeccionou várias réplicas desse Oscar alternativo para distribuir para as celebridades durante a cerimônia de entrega do prêmio. Cada estatueta foi feita com 500 peças de Lego. E não é que o Oscar de brinquedo passou a ser mais disputado que o verdadeiro? Julianne Moore e Emma Stone que o digam!


 

FONTES

https://www.reddit.com/r/lego/comments/8dzyuk/classic_hollywood_film_studio_modular_moc_wip/

https://imgur.com/a/nmPfOf3

https://www.brothers-brick.com/2007/10/08/alex-eylar-goes-to-old-hollywood/

https://www.flickr.com/photos/8344872@N05/

https://www.dailymail.co.uk/news/article-2792721/the-hills-alive-sound-plastic-teenager-recreates-dozens-cinema-s-unforgettable-scenes-lego.html

https://www.buzzfeed.com/mikespohr/all-of-hollywood-history-in-lego-form

https://www.lamag.com/laculture/massive-lego-version-los-angeles-insanity/

https://www.ifitshipitshere.com/freestyle-lego-build-of-manhattan/

https://www.ideo-bricks.com/lego-vip-hollywood-oscar-statue/

http://g1.globo.com/pop-arte/oscar/2015/noticia/2015/01/esnobado-do-oscar-de-animacao-diretor-constroi-estatueta-de-lego.html

http://g1.globo.com/pop-arte/cinema/noticia/2014/02/g1-ja-viu-uma-aventura-lego-tem-bom-visual-e-mensagem-para-pais.html

 


quarta-feira, 11 de novembro de 2020

LOONEY TUNES, A HISTÓRIA DOS ÍCONES DA NOSSA INFÂNCIA

 


Se você mora neste planeta há algum tempo, com certeza já assistiu a algum desenho dos Looney Tunes. Caso o nome não signifique nada para você, são os desenhos da Warner Bros., que tinham como personagens figuras clássicas como Pernalonga, Patolino, Ligeirinho, Frajola e Papa-Léguas. A série de animações foi produzida entre 1930 e 1969, um período fértil em termos de criatividade para esse tipo de arte.

O que eu sempre quis saber é: qual a origem dos Looney Tunes? O que significa esse nome, e o que quer dizer “Merry Melodies”, que a gente via escrito em muitas vinhetas de abertura desses desenhos? Quem bolou a icônica trilha sonora? A empresa ACME realmente existiu? E como surgiu o bordão “Por hoje é só, pessoal!” (“That’s all, folks”, em inglês)? Resolvi finalmente matar a curiosidade e dividir minhas descobertas com vocês.



Nossa história começa (aposto que você leu com a voz do narrador do Looney Tunes!) no ano de 1930, quando um cara chamado Walt Disney (que dispensa apresentações) estava bombando nos cinemas com a histórica série de desenhos chamada “Silly Symphonies” (em português, “Sinfonias Tolas”), que trouxe personagens como os Três Porquinhos. De olho na concorrência, os irmãos Warner, donos do estúdio de mesmo nome, escalaram o produtor Leon Schlesinger para criar a própria linha de animações da casa. O nome do projeto era descaradamente parecido: “Looney Tunes” (uma brincadeira com a expressão “Canções Malucas”). Como se não bastasse, a Warner Bros. criou no ano seguinte (1931) uma série-irmã dos Looney Tunes, chamada (vejam só) “Merrie Melodies” (que significa “Melodias Alegres”).


       

Se no nome as produções da Warner não eram nada criativas, em todo o resto elas foram revolucionárias. Os primeiros personagens foram a hoje pouco lembrada dupla Bosko & Honey, um sub-Mickey e uma sub-Minnie. Nos créditos já se via os nomes de Paul Smith (que mais tarde trabalharia com Walter Lantz, o criador do Pica-Pau) e Isadore “Friz” Freleng (que continuaria por muito tempo no estúdio até deixá-lo em 1963, para fazer A Turma Da Pantera Cor de Rosa”). Eram desenhos boboquinhas, cujo traço copiava descaradamente o das primeiras animações do Mickey, como o pioneiro “Steamboat Willie” (https://www.youtube.com/watch?v=hxf-UHuGobI). 




Neste episódio de Bosko que eu compartilho abaixo, dá pra ver a polêmica que a série iria causar, pois o personagem não é um animal, e sim (o que parece ser) um garoto negro. Tá legal, não é nenhum Mickey Mouse, mas tem cenas hilárias como a da vaquinha dançarina que, não sei por que motivo, me fez lembrar a Vaca Gilda, personagem do cartunista e apresentador infantil brasileiro Daniel Azulay na década de 1980 (https://www.youtube.com/watch?v=UXZyKFRj90o).



A Warner apostou com tudo no personagem. Acredite, em apenas três anos foram feitos 57 curtas de Bosko e sua turma. Inclusive, no episódio “Sinkin’ In The Bathtub” (“Afundando na Banheira”) foi usada pela primeira vez a frase “That’s All, Folks” (“Por hoje é só, pessoal!”), que viraria o tradicional bordão de encerramento dos Looney Tunes. https://www.youtube.com/watch?v=GaE6OySzq5g&list=PLYQzAkyHuhtSAw5EsYqreAKB8b7xeStS6&index=5

Após desentendimentos, os animadores Hugh Harman e Rudolf Ising se desentenderam com Schlesinger e foram trabalhar para a MGM. Há males que vêm para bem. Friz Freleng, o diretor que permaneceu na Warner, reuniu um time de jovens animadores para recomeçar a série praticamente do zero. Neste seleto grupo, estavam Bob Clampett e Charles “Chuck” Jones, que se tornariam pilares da série nos anos seguintes. Deu resultado. Em 1935, estreava nas telas o primeiro personagem clássico dos Looney Tunes, o Gaguinho (Porky Pig, em inglês).



O suíno tímido de fala atrapalhada ganhou o coração do público, inaugurando uma galeria de tipos icônicos. O briguento Patolino (Daffy Duck, no original) foi lançado para concorrer com o também pato e também nervosinho Donald da Disney, mas acabou ganhando personalidade e luz próprias.

Feliz com o sucesso dos novos personagens, a Warner Bros. decidiu criar um companheiro de trapalhadas para o Gaguinho. Tex Avery, Chuck Jones e Bob Clampett se juntaram para construir essa figura. Misturaram Groucho Marx com Clark Gable e o mundo animal, e o que saiu foi um coelho completamente alucinado, irreverente e debochado, que adora comer cenoura. Era ele mesmo, o Pernalonga. Seu nome em inglês, Bugs Bunny, significa algo como “coelho doido”, e definia bem o que era o personagem. Inclusive, o hábito do Pernalonga de devorar cenouras surgiu de uma cena do filme “Aconteceu Naquela Noite” (https://poltrona-r.blogspot.com/2016/10/dvd-aconteceu-naquela-noite.html), em que o personagem de Gable come este legume em um lanche rápido  (https://www.youtube.com/watch?v=Wcrth90C3D4). Toda vez que era provocado, Pernalonga encarava o adversário com cinismo e soltava o inconfundível bordão “O que é que há, velhinho?” (“What’s up, doc?”, no original).



Mas quem iria dar uma voz ao Pernalonga? Ninguém menos do que o genial Mel Blanc (https://poltrona-r.blogspot.com/2017/04/mel-blanc-o-homem-das-mil-vozes.html), o maior dublador da história dos desenhos animados. Uma curiosidade bizarra é que a risada criada por Blanc para o desenho “Porky’s Hare Hunt” (“Gaguinho na caça ao coelho”) não emplacou nos desenhos da Warner, mas viraria febre ao ser aproveitada em outro ícone da animação, o Pica-Pau, de Walter Lantz. Assistindo ao episódio hoje, é bastante estranho ouvir a gargalhada do pássaro doidão na boca de outro personagem. Vale a pena conferir:



Enquanto a “Silly Symphonies” da Disney já tinha desenhos em Technicolor desde praticamente seu início, os “Looney Tunes” da Warner ainda eram produzidos em branco e preto. “Merrie Melodies”, porém, já era colorida. A partir de 1943, ambas as séries passaram a ser produzidas em cores.

Em obras de animação, a música é tudo. E os desenhos da Warner Bros. já haviam utilizado toda a vasta biblioteca musical do estúdio em 1937, quando o grudento tema de abertura e encerramento dos Looney Tunes, intitulado “The Merry-Go-Round Broke Down”, composto por Cliff Friend e Dave Franklin, começou a ser utilizado (https://www.youtube.com/watch?v=XwiQVKOrejo). No mesmo ano, “Merrily We Roll Along”, de autoria de Charles Tobias, Murray Mencher e Eddie Cantor, foi escolhida como trilha de “Merrie Melodies” (https://www.youtube.com/watch?v=mGM0xkHD6jQ).  



Agora, com Pernalonga, Patolino e Gaguinho, a Warner Bros. finalmente tinha munição para peitar a Disney. Mas faltava um diferencial. A Warner teve uma sacada: ao contrário do estúdio do mestre Walt, que produzia desenhos ingênuos, voltados mais às crianças e trazendo lições de moral, os Looney Tunes iriam esculachar. Pernalonga e sua turma viveriam aventuras recheadas de sarcasmo, irreverência e crítica social. E não foi só isso. Em vez de seguir o estilo disneyano de dar aos personagens e cenários o maior realismo possível, a estética escolhida pela Warner foi deixar os desenhos com aparência propositalmente tosca, mas recorrer ao deboche e a sacadas surrealistas, como objetos inanimados que, do nada, ganhavam vida própria.

Outra coisa interessante de se observar é que os desenhos da Warner Bros. que tinham bichos como protagonistas misturavam personagens humanos e animais, coisa que não ocorria nos curtas da Disney estrelados por Mickey, Pateta e Donald. Já os Looney Tunes geralmente se valiam dessa combinação para ridicularizar gente, e não bichos. Isso incluía celebridades, como Humphrey Bogart, o astro do filme “Casablanca”. Ele dá uma “canja” neste episódio que eu separei, feito em 1950. O título é “8 Ball Bunny”, batizado no Brasil de “Esse Pinguim É Uma Fria”.



Uma coisa importante de lembrar é que nos anos 30 e 40, ainda não existia um público-alvo específico para os desenhos animados. Os curtas de animação eram exibidos antes dos filmes, como uma espécie de “aperitivo”. Dá para entender por que vários cartunistas da época inseriam piadas adultas em suas obras. Aos poucos a Disney foi investindo cada vez mais no chamado entretenimento familiar (agradar principalmente às crianças, mas também às outras faixas etárias). A Warner Bros., porém, manteve o humor como carro-chefe. E revolucionou ao “quebrar a quarta parede” (ou seja, fez com que os personagens conversassem com o público) em alguns episódios.

O elenco animado da Warner foi aumentando nos anos seguintes: vieram Piu-Piu (Tweety) em 1942, Frajola (Sylvester) em 1945, Frangolino (Foghorn Leghorn) em 1946, Papa Léguas (Road Runner) em 1949, Taz (Tasmanian Devil) em 1954Ligeirinho (Speedy Gonzales) em 1955, e vários outros que eu só não vou citar aqui por falta de espaço. Um personagem polêmico, o gambá conquistador Pepe Le Pew (que, até hoje, muitos consideram um estereótipo racial dos franceses), havia sido idealizado por Chuck Jones em 1930, mas só foi resgatado e aproveitado em 1945. A inspiração para Pepe foi o ator Charles Boyer.



A popularidade dos Looney Tunes já era grande, mas explodiu durante a década de 1950, quando a série foi exibida, junto com “Merrie Melodies”, na televisão, que era uma mídia recém-criada. Porém, os desenhos foram, em sua maioria, editados e tiveram cenas cortadas por serem tidas como inadequadas ao público infantil. Nos anos 60, a Warner Bros. desativou seu estúdio de animação, e os desenhos de curta-metragem passaram a ser produzidos pela De-Patie Freleng, estúdio que tinha como sócios David DePatie e Friz Freleng. A queda na qualidade dos trabalhos era visível logo nos créditos, que já davam uma ideia do empobrecimento visual que essa mudança tinha provocado.

Entre as décadas de 1970 e 1990, foram produzidos diversos especiais e longa-metragens com Pernalonga e Patolino, mesclando trechos de desenhos antigos a cenas inéditas. Era uma nova geração de fãs que estava surgindo. Porém, a produção de curta-metragens foi retomada apenas em 1987. Além disso, a TV a cabo passou a exibir a chamada “Hora ACME”, dedicada exclusivamente a desenhos clássicos da Warner Bros.



Mas que diabos é ACME? Espécie de versão ianque das Organizações Tabajara do “Casseta e Planeta” (https://www.youtube.com/watch?v=CJyZT5YkQa0), a ACME era um conglomerado fictício que fabricava os produtos inimagináveis que os personagens da Warner utilizavam nos desenhos. A primeira vez que a marca apareceu foi no curta-metragem “Buddy’s Bug Hunt”, de 1935 (https://www.youtube.com/watch?v=oYcpuZMcl_Y&t=15s). O nome ACME é uma sigla que significa “A Company That Makes Everything” (“uma empresa que faz tudo”). O maior cliente da ACME era, com certeza, Coyote, o vilão que recorria aos lançamentos da empresa para tentar capturar o Papa-Léguas. Garimpando no YouTube, encontrei essa montagem só com produtos ACME, em cenas extraídas de episódios variados. Tem livro, graxa, cola, ração pra passarinho, ratoeira, brinquedos, roupas, remédio pra dor de cabeça, papel pega-mosca... Enfim, a ACME produzia de tudo, mesmo.

 


Falando em produtos, na vida real a franquia Looney Tunes virou uma marca cuja força faria inveja aos “donos” da ACME, caso a superempresa que Coyote adora realmente existisse. Todo tipo de artigos com a imagem dos personagens já foi lançado no mercado.

Inclusive, os Looney Tunes alcançaram uma glória sonhada por muita celebridade hollywoodiana nos anos 70 e 80: virar cabeça das balas PEZ. De origem austríaca, as guloseimas tinham como marca registrada a embalagem retangular cuja parte de cima era o rosto de algum personagem da moda. Na minha época, a gente ganhava essas balas como lembrancinha nas festas de aniversário das outras crianças e guardava como se fosse souvenir. Como o colecionismo estava no auge, havia meninas e meninos que tinham um arsenal de embalagens de PEZ e até trocava aquelas com personagens repetidos, como se fossem figurinhas. 


 

De olho em uma nova e crescente fatia de público – as crianças em idade pré-escolar – em 2001 foi lançada a série “Baby Looney Tunes”, que retratava Pernalonga e sua turma ainda pequeninos. A sacada não é nova – nos anos 80 o “Muppet Show” (https://poltrona-r.blogspot.com/2017/05/meus-15-momentos-musicais-favoritos-dos.html) ganhou uma versão em desenho animado chamada “Muppet Babies” (https://www.youtube.com/watch?v=iozn7cdiEXo), e “Os Flintstones” tiveram sua versão infantil, “Os Flintstones Nos Anos Dourados” (“Flintstones Kids”) https://www.youtube.com/watch?v=eW2sf_IR8jQ. Então por que não criar uma série com os Looney Tunes criancinhas?



Como era de se esperar, essa foi mais uma idéia nada original, mas totalmente certeira. Os Baby Looney Tunes ganharam o coração da garotada mais novinha e, claro, geraram lucros e deram origem a uma linha própria de produtos, a maioria destinados a bebês. Para quem quer divertir a molecadinha, essa página aqui tem ilustrações dos Baby Looney Tunes para imprimir e colorir: http://www.desenhosparacolorir.org/desenhos/104-desenhos-para-colorir-Baby-Looney-Tunes.html

Acredito que mais gerações de fãs dos Looney Tunes ainda virão. Principalmente se o acesso aos episódios mais antigos for facilitado. São obras que fizeram história, tanto no cinema quanto na vida da gente. A saga dos Looney Tunes na indústria do entretenimento ainda está longe de acabar. Mas aqui no blog, por hoje é só, pessoal!

 


FONTES

https://dublagempedia.fandom.com/pt-br/wiki/Lista_de_Personagens_dos_Looney_Tunes

https://pt.wikipedia.org/wiki/Looney_Tunes#Personagens

https://super.abril.com.br/cultura/a-louca-etimologia-dos-nomes-dos-personagens-de-desenho/

https://www.hypeness.com.br/2020/06/looney-tunes-recria-desenhos-com-personagens-classicos-sem-armas/

http://www.tribunadonorte.com.br/noticia/pernalonga-80-anos-de-um-dos-personagens-mais-importantes-da-animaa-a-o/485711

https://entretenimento.uol.com.br/noticias/redacao/2020/06/08/looney-tunes-armas-hbo-max.htm

https://www.papelpop.com/2020/05/looney-tunes-personagens-criam-confusoes-em-primeiras-imagens-da-nova-serie/

https://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq2602200209.htm

https://super.abril.com.br/especiais/o-que-e-que-ha-velhinho/

https://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/reportagem/looney-tunes-racista-censored-eleven.phtml

https://www.uol.com.br/start/ultimas-noticias/2017/10/10/qual-e-a-origem-da-empresa-acme-dos-desenhos-do-papa-leguas.htm

https://pt.wikipedia.org/wiki/ACME

https://pt.wikipedia.org/wiki/Baby_Looney_Tunes

https://en.wikipedia.org/wiki/Baby_Looney_Tunes

http://www.autobahn.com.br/lembrancas/balas1.html

https://en.wikipedia.org/wiki/Pez

https://www.mashed.com/216050/the-untold-truth-of-pez-candy/

  

LINKS ALTERNATIVOS

Steamboat Willie: https://www.youtube.com/watch?v=BBgghnQF6E4

Vaca Gilda: https://www.youtube.com/watch?v=M5IRXZUlRwo

The Booze Hangs High: https://www.youtube.com/watch?v=LKzg7HnaVWk

Sinkin’ In The Bathtub: https://www.youtube.com/watch?v=j2i2lxMmPRA

The Merry-Go-Round Broke Down: https://www.youtube.com/watch?v=GTY6ubgC5-c

Merrily We Roll Along: https://www.youtube.com/watch?v=TSMOrBpbvZM&t=12s

8 Ball Bunny (em inglês): https://www.youtube.com/watch?v=Dm_e-6D1hWg

Organizações Tabajara: https://www.youtube.com/watch?v=CJyZT5YkQa0

Produtos ACME: https://www.youtube.com/watch?v=Og67Wwhhe6Q

Baby Looney Tunes (Dente de Leite): https://www.youtube.com/watch?v=eeyKmrt4V-U